Capitalismo

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

CRÔNICA DA BOLA III


UM PAÍS CHAMADO FUTEBOL
Demorou mas saiu: o texto da nossa última eletrizante partida quase que fica para o ano que
vem. As desculpas – todas descabidas – são muitas. Primeiro, estou de férias; e cronista de férias
não escreve! Segundo, não ganhei a partida; e a história contada do ponto de vista dos derrotados
nunca teve a menor graça, não passa de choramingos daqueles que perderam a guerra. Terceiro e
mais importante, não fui ao churrasco, não bebi, não ouvi as mentiras dos cuzidos, portanto, faltava
inspiração. Isso posto, vamos aos fatos. Porque contra fatos não há filósofos que argumentem.
Parecia um dia comum, o sol brilhava e quase todos estavam atrasados. Uns poucos perdidos
foram chegando: Marcelino mostrando a chuteira nova, Carlos e Zé Paulo marcando presença, e até
o Thiago caminhando em slow motion como sempre. De repente, a surpresa: nosso querido Jefinho
aparece trajando uma farda futebolística verde, envergando no peito estufado a vontade de
participar do combate que se anunciava. Mas não era só isso. Vinha seguido de perto por um
gigante barbudo de feições um tanto quanto amedrontadoras. Seria o irmão de Jefinho, recrutado
para função de guarda-costas? Seria um clone mal clonado do Lula? Seria o ator que fez o rei
Leônidas do filme 300 depois da gripe suína?, pois ele também vestia uma camiseta do coxa. Não
era. Tratava-se, como viemos a saber depois, do representante do honorável goleiro Alexandre. Qual
seu parentesco ou nível de envolvimento amoroso-afetivo não sabemos, mas do que ninguém
duvida, dada a portentosa estatura do sujeito, é que se trata de um verdadeiro farol de Alexandria.
Valendo-se de suas habilidades hipnóticas desonestas, antes de escolhê-la como seu próprio
time, Fabião fez uma verdadeira seleção: Marlos “o dono-da-bola-perdida” (vulgo “homem de uma
bola só”); Zé Paulo, o “volante- moderno-que-defende-e-ataca-não-necessariamente-nessa-mesmaordem”;
Thiaguinho “aaaaaqueeeeeleeee beeeeemmm veeeelooooozzz
zzzzzzzzZZZZzzzzzzzzzzzzzZZZz”; Sr Wilson, “o náufrago” e maior goleador do time sueco na
copa de 58 (vulgo “gigante albino”).
Já nosso pobre time contava como este que vos fala; mais o Carlos com tendinite aguda e o
Marcelino semi-alcoolizado; ainda o Jefinho estacionado dentro do gol do Fabião e a toda hora
sofrendo pênaltis não marcados; tínhamos o habilidoso Robinho, é fato, mas quase que só, além do
gigante barbudo da perna-de-pau (até aquele momento ninguém sabia quem era ele, o quê era ele e
de onde vinha!, seria um espião da SEED?). Alexandre só chegou bem depois.
Todos à postos, rolou-se a pelota. No primeiro lance Jefinho quase estufou as redes. Mas
conversa-vai-e-conversa-vem, começamos a levar gols. Muitos gols. Gols fáceis, gols difíceis, gols
de qualquer jeito, gols que nem sei dizer, gols que não acabavam mais. Fazíamos um e levávamos
três.
Nos ressentimos da falta do grande mineiro Newton, vulgo Santos, “a enciclopédia”, porque
de bola ele sabe tudo (só não sabe o caminho do estádio), cujo paradeiro resumiu-se em localização
incerta e não sabida. E dá-lhe saraivada, já estava sete a zero.
Foi quando o milagre aconteceu. Jefinho tocou com perfeição e a bola arrebentou nos braços
exageradamente abertos do zagueiro-engenheiro. Em seu favor, ele não teve culpa. Mas regra é
regra. Bola na marca da cal, Jefinho aponta pra fora e quase destrói a parede da cancha. Perdemos
uma grande chance de diminuir o humilhante placar. Mas serviu como motivação. Mais alguns
minutos e a bela torcida feminina composta exclusivamente pela pequena Soraya estaria explodindo
de paixão ao presenciar o mais belo gol cagado da história desse brasilzão de meu Deus: Marcelino
Romarinho chutou a bola fora do alcance de Fabião que se estatela no gramado; enquanto tenta
desentortar sua pobre coluna cervical, o goleiro sente a mesma sendo atingida pela bolada que lhe
agride os fundilhos; a bola havia acertado a trave, sua nuca, escorreu pelas costas e caiu pela
retaguarda até romper a linha de gol. Não fôssemos ateus em matéria de futeba – que Deus não se
mete nessas ninharias, diríamos que foi esse o verdadeiro gol espírita. Diz a lenda que Fabião ainda
está lá tentando calcular toda física envolvida. Nisso o Alexandre chegou e não tomamos mais gols.
Marcelino ainda aprontou outra: um belíssimo gol de “carcanhá” em cima do nobre Marlos,
cujo destino parece ser irremediavelmente o de servir de massa-de-manobra para satisfazer os
desejos egoístas do Fabião que nessas alturas, mais uma vez, abandonava o gol aos cuidados do
esforçado, porém não capacitado, pequeno engenheiro. Uma investigação mais apurada ainda
descobrirá, tardiamente, que Marlos é, na verdade, professor. Engenheiros trabalham menos e
ganham mais; professor é como ele: se esforça, se empenha, ajeita o meio-de-campo, sustenta na
defesa, parte para o ataque. Quando joga bem ninguém se lembra, quando joga mal ninguém
esquece. Abandona a SUDE rapaz. Isso até lembra o comercial: vem pra APP você também, vem!
Falando disso, tanto esforço de nossa parte, tanta correria, tantos gols. De nada adiantou:
perdemos por um a zero. Pelo menos o Marcelino aceitou sair de campo derrotado por esse magro
placar e deixar a quadra para os próximos jogos da noite que já adentrava. Isso mesmo, ficamos
jogando por mais de uma hora e meia, até empatar. Mesmo assim não deu. Mas valeu.
Talvez seja o natal, não sei. O certo é que esse jogo me comoveu, gostei de ver o Marcelino
pulando feito criança ao marcar aquele golaço (seria efeito da cachaça?). Não teve quem não sorriu.
E ver o Jefinho chutando igual ou melhor do que nós (o que, convenhamos, nem é tão difícil assim),
sem pieguice, é de emocionar. O garoto é dos nossos. E de certa forma somos todos irmãos, pois de
um jeito ou de outro, nós todos somos os filhos de um país que bem poderia se chamar “Futebol”.
Chega de crônicas, estou de férias! Semana que vem tem mais.

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